Referência: Recebimento Diverso nº RD.00768.00045/2011
(PR.01229.03169/2011-8)
Ilmo(a). Sr(a). Giovanni Gomes,
Ao cumprimentar Vossa Senhoria, remeto-lhe, em anexo, despacho que
indeferiu a instauração de inquérito civil para investigar a sua
representação encaminhada à Ouvidoria do Ministério Público.
Outrossim, cientifico-lhe do prazo de 10 dias para apresentar
recurso, a ser encaminhado para apreciação do Conselho Superior do
Ministério Público.
Atenciosamente,
André B. C. MacDonald,
Promotor de Justiça.
Recebimento Diverso nº RD.00768.00045/2011
Origem: PR.01229.03169/2011-8
Requerente: Giovanni Gomes
Requerido: Município de
Esteio
Vistos.
1 O Sr. Giovanni Gomes remeteu mensagem de correio
eletrônico à Ouvidoria do Ministério Público, acompanhada de 18 fotografias, na
qual narrou o seguinte:
O descaso do governo com a população esteiense é lastimável
Ruas em péssimas condições , onde tem ocorrido prejuízo com
danos nos veículos ,suspensão, rodas, amortecedores etc
E ate ouve a queda de um motociclista que ao desvia-se de
pedestres caiu por causa do péssimo estado da via :
Principais avenidas de Esteio em péssimas condições:
Av. Porto Alegre Bairro Olímpica
Av. Padre Clarete inicia no centro na Av. presidente Vargas e
vai até Av. Luiz Pasteur
24 de agosto inicia no centro na Av Presidente Vargas E vai ate Av. Padre Antônio Vieira
Av. João frainer inicia no final da Rua Santana e vai ate a Av. Porto Alegre Santo Inácio
Av. Bento Gonçalves
bairro Centro
A
representação foi distribuída na Ouvidoria sob o nº PR.01229.03169/2011-8,
sendo remetida a esta Promotoria de Justiça via Sistema de Protocolo Unificado
(SPU).
É o breve
relato.
2 Não merece ser instaurado Inquérito Civil nem tomada
qualquer providência pelo Ministério Público.
Segundo se
verifica nas fotografias juntadas ao e-mail,
apesar de existirem buracos e irregularidades em diversas ruas e avenidas do
Município, o problema não impede o trânsito normal de veículos, mas apenas o
dificulta, de modo que não há óbice ao direito de ir e vir dos moradores. Além
disso, é público e notório que o problema dos buracos nas vias de rolamento não
existe apenas nos locais fotografados pelo autor da representação, mas também
em diversas outras ruas desta cidade, situação que se repete em praticamente todos
os municípios brasileiros.
É esperado
do Poder Executivo local que tome providências para consertar as
irregularidades, que causam danos aos veículos e aumentam os riscos de acidentes.
No entanto, não pode o Ministério Público provocar o Poder Judiciário para
obrigar a Municipalidade a tapar os buracos nas vias, pois se trata de ato de
natureza político-administrativa.
No mundo
jurídico, há grande discussão acerca dos limites do Poder Judiciário em
intervir em políticas públicas. Sem dúvida alguma, quando se trata de direitos
fundamentais – como saúde, educação e atendimento às crianças, idosos e pessoas
com deficiência –, é possível provocar o Judiciário para assegurá-los, conforme
se verifica no seguinte acórdão do Superior Tribunal de Justiça, referente a
ação civil pública ajuizada por este agente ministerial a respeito de
distribuição de medicamentos especiais neste mesmo Município:
ADMINISTRATIVO – CONTROLE
JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS – POSSIBILIDADE EM CASOS EXCEPCIONAIS –
DIREITO À SAÚDE – FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS – MANIFESTA NECESSIDADE – OBRIGAÇÃO DO PODER PÚBLICO – AUSÊNCIA DE
VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES – NÃO OPONIBILIDADE DA RESERVA
DO POSSÍVEL AO MÍNIMO EXISTENCIAL.
1. Não podem os direitos sociais ficar condicionados à boa
vontade do Administrador, sendo de fundamental importância que o Judiciário
atue como órgão controlador da atividade administrativa. Seria uma distorção
pensar que o princípio da separação dos poderes, originalmente concebido com o
escopo de garantia dos direitos fundamentais, pudesse ser utilizado justamente
como óbice à realização dos direitos sociais, igualmente fundamentais.
2. Tratando-se de direito
fundamental, incluso no conceito de mínimo existencial, inexistirá
empecilho jurídico para que o Judiciário estabeleça a inclusão de determinada
política pública nos planos orçamentários do ente político, mormente quando não
houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa
estatal.
3. In casu, não há empecilho jurídico para que a ação, que visa
a assegurar o fornecimento de medicamentos, seja dirigida contra o município,
tendo em vista a consolidada jurisprudência desta Corte, no sentido de que
"o funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) é de responsabilidade
solidária da União, Estados-membros e Municípios, de modo que qualquer dessas
entidades têm legitimidade ad causam para figurar no pólo passivo de demanda
que objetiva a garantia do acesso à medicação para pessoas desprovidas de
recursos financeiros" (REsp 771.537/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda
Turma, DJ 3.10.2005).
Agravo regimental improvido.
Ao
contrário do caso do acórdão do STJ, a representação em tela não trata de
mínimo existencial, mas da melhoria na pavimentação das ruas da cidade, o que
está no âmbito do poder discricionário do Administrador Público. Então,
aplica-se a teoria do judicial self-restraint,
segundo a qual o Poder Judiciário deve deixar certas questões para ser tratadas
na esfera do jogo político, cujos atores são outros poderes.
Em outras
palavras, o Prefeito Municipal é eleito justamente para escolher as
prioridades, uma vez que o orçamento do ente público é limitado e insuficiente
para atender todas as demandas da população. Por isso, não é Ministério Público
que deve buscar a reforma das pavimentações danificadas, mas sim os eleitores,
através de instrumentos políticos: mobilização, remessa de cartas, reunião com
membros do Executivo e do Legislativo, voto nas eleições, etc.
Salvo
melhor juízo, somente haveria legitimidade ao Parquet se os buracos fossem de tal tamanho que impedissem por
completo a circulação de veículos (ou seja, o direito de ir e vir das pessoas)
ou se as irregularidades causassem grande risco de acidentes (por exemplo, não
sendo perceptíveis aos motoristas, caso em que poderia exigir da Administração
ao menos que as identificasse com sinalização de trânsito enquanto se aguarda o
conserto).
3 Isso posto, indefiro
a instauração de inquérito civil ou a adoção de outras providências.
Remeta-se,
por correio eletrônico, o presente despacho ao autor da representação,
cientificando-o do prazo de 10 dias para a interposição de recurso nesta Promotoria
de Justiça, a ser encaminhado para análise do Conselho Superior do Ministério
Público.
Decorrido o
prazo recursal in albis, arquive-se,
com baixa no SGP.
Esteio, 14 de
setembro de 2011.
André
Baptista Caruso MacDonald,
Promotor
de Justiça.